A coisa é grave! O bursaphelenchus xylophilus, de baptismo, mais conhecido entre a súcia pelo nemátodo do pinheiro, até agora confinado a algumas regiões a sul do rio grande, está inapelavelmente a dirigir-se para norte. “Que se cuide o Pinhal do Rei”, parece gritar por entre estridentes gargalhadas guturais o longicórnio do pinheiro, insecto vector que transporta na sua traqueia, imagine-se, o microscópico facínora que nutre especial devoção e apetite pelo pinheiro bravo. “Agulhas amareladas e murchas, começando pelas mais jovens, que ficam na árvore por longos períodos de tempo”, “árvores com a copa total ou parcialmente morta”, “murchidão generalizada e súbita”, eis alguns dos sintomas agonizantes, após infligido o letal ataque do bárbaro agressor.
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Bastou que o mercado na Wall Street cedesse, para que o mercado na Feira dos Porcos vacilasse, fazendo jus ao dichote popularucho – até a barraca abana! - coisas da globalização. Mas se lá foi a ganância pelo argém que acendeu o rastilho, cá foi a ganância pela legalidade, das leis, essas estranhas e curiosas linhas que delimitam a acção e o modo, umas vezes mais esticadinhas e niveladas que um prumo, outras vezes mais flácidas e serpenteantes que uma jibóia perguiçosa, tudo dependendo do olho director do sicrano ou do beltrano que as mire, de vesgo soslaio ou com modos de mirante conhecedor. É conforme.
A verdade é que, após uns quantos meses a estagiar em cascos de carvalho francês nas bafientas sub-caves dos paços (ainda se está para perceber porquê…), foi servido a contra-gosto à oposição, um parecer de violação dos pormenores da zona de implante do barracame, com rótulo de agarranado e com indicação de proveniência - comissão de região demarcada de origem duvidosa. “Cá está!” exclamou a oposição, finalmente o elemento que faltava para completar o puzzle da infracção e fazer soltar o gás. Logo a madre de Calcultá encabeçou a rebelião e brandindo o documento-prova diante dos prestimosos servidores da comunicação de massas, sequiosos de sangue quentinho para uma cabidela avinagrada, reclamou em tom de cantilena pueril: “violaram, violaram, violaram! Bem-feita, bem-feita, bem-feita!”. Mas espera que não se ficaram sem resposta! Logo um arcediago sabido e um cacifeiro ofendido (este na dupla qualidade de vendedeiro e de utenteiro), a duas vozes, afinadinhos, saltaram em defesa da honra, devolvendo a cantilena monocórdica sob a forma de argumentação barata e bacoca: “vocês é que violaram, vocês é que violaram! Queixinhas, queixinhas, queixinhas!”.
Psschiuu!!! Então meninos? Compostura! Tino, porra! Mas por acaso vocês acham que nós estamos interessados em saber quem violou mais vezes a lei? Vocês acham que nós acreditamos nas vossas intenções quando nos dizem aquilo que vos convém em cada momento? Vocês acham que somos parvos, ou quê? Nós estamos interessados é que as leis se cumpram, e em primeiro lugar pelos que nos devem o exemplo. Nós estamos interessados é que subam, não o tom, mas o nível da discussão. Nós estamos interessados é que tenham e-s-t-r-a-t-é-g-i-a! Nós estamos interessados é que tenham i-d-e-i-a-s e as c-o-n-c-r-e-t-i-z-e-m, que sejam c-o-e-r-e-n-t-e-s! Será que é pedir muito? Vá lá meninos, tento na língua, olhem para o exemplo dos vossos colegas aí à direita, caladinhos, sossegadinhos, bem comportados, com umas asinhas brancas e uma auréola beatífica. E porquê? Porque fazem sempre os deveres e portam-se sempre bem. ENTENDIDO?
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Cidadãos de Santa Maria da Marinha, a quem o ministro marquês um dia dispôs que se chamasse, para nossa honra e glória, Marinha Grande, anuncio-vos o óbvio: o bursaphelenchus xylophilus há muito que tomou conta dos pinheiros da nossa cidade, em particular daqueles em quem fomos confiando, seguros das suas fundas raízes, tronco firme, sombra generosa e seiva abundante. Afinal, estão murchos.
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Há duas estratégias possíveis para combater este flagelo do nemátodo do pinheiro. A primeira estratégia, a que está em curso, resulta do estado de letargo geral e aponta para uma sépsia generalizada das diversas espécies de pinheiros, no pressuposto de que quando já não houver mais cuníferas para infectar o nemátodo se erradica a si próprio. É uma estratégia destrutiva e causadora de incalculáveis prejuízos.
A segunda estratégia, a mais difícil, resulta da vontande inconformista e de não resignação, apontando no sentido dum combate feroz e ingente ao longicórnio do pinheiro, o tal insecto vector que transporta o minúsculo macaréu. Este insecto de ambição desmedida, que pulula e parasita indiferente em torno das nossas florestas, é ele próprio também uma praga que urge fulminar, pois parecendo inofensivo e inócuo é o terrível e abominável hospedeiro que permite a disseminação desta abjecta doença, que mina a saúde e a alma dos nossos pinheiros.