Este ano, a pouco tempo de atingir a idade da pré-reforma, prestes a alcançar o estatuto de trabalhador dispensável aos olhos dum modelo económico implacável - mas que não me livra da condição de contribuinte indispensável - e finalmente aliviado da pensão de alimentos com que anos a fio tenho alimentado a azémola (e a progenitora!), decidi mimosiar-me com umas vacances à colau, um mês de boa cama, de boa comida, de bons néctares e de bons tratos. As análises ficam para depois do Natal que até lá o S. Martinho, os Santos e dois ou três repastos de indefectíveis anibrestes, requerem a disponibilidade total das papilas, das glândulas e das entranhas, sem medo de prevaricar, sem medo que me assalte a má consciência por violação sistemática das recomendações do doutor. Oxalá os aparelhos olfactivo, digestivo, circulatório e os sensores de estacionamento funcionem e estejam à altura da degustação, enquanto o reprodutivo entra em ibernação até ao próximo estio – como diria o comendador Joe-da-Madeira, reputado mecenas e sincero compagnon de route dos trabalhadores da PT, cujos neurónios foram substituídos (com sucesso) por pilim, “o meu vício de verão é fazer o amor”. Palavras sábias.
Alcafache, Sátão, S. Pedro do Sul, Viseu, Vouzela, percorri o Dão-Lafões de lés-a-lés, umas férias inesquecíveis por terras que há muito não revisitava – desde os tempos em que vendia candeeiros com pingentes e mais tarde ampolas, seringas e provetas. Viajei por águas termais, medicinais, sulfurosas, por generosos vinhos de sabores e aromas frutados, esculpidos com sabedoria e com gosto a partir de nobres castas portuguesas, afinados em madeiras virtuosas. É interessante como águas e vinhos partilhando o mesmo bispado se completam em harmonia, cada qual cumprindo a sua nobre função sem contudo perderem a identidade, única e inconfundível. Virtudes da natureza e da democracia.
Da vitela à Lafões, suculentos nacos de carne com o tempero certo e o dedo de quem sabe, guardo gratas recordações e fartas digestões. Mas o que descobri este Verão na riqueza da boa mesa beirã, foi um divinal pudim conventual a que dois dedos de azeite extra-virgem da Cova da Beira acrescentavam um inenarrável requinte e uma riqueza digna de abastado camarista - a diferença está muitas vezes no pormenor que alguns cultivam com mestria e que outros com sobranceria ignoram.
Diz o povo que o que é bom depressa se acaba e um mês de requinte esfumou-se num ápice. Sobra ao andarilho anacoreta, de volta à terra que teima em amar, a alma confortada, a barriga cheia, o nariz desentupido e as muitas saudades da “vizinhança”. Mas por tudo o que viu, sentiu, cheirou, provou, por toda a admiração que sente pelas gentes beirãs que transformaram (e transformam) o interior do país num local onde vale a pena viver, este andarilho também volta com uma imensa esperança de que o exemplo por cá se replique, para que os dias passem a ser diferentes e o olhar se projecte no futuro.
Consultado o compadre Zé Cipriano, escritor popular da Fonte Santa que por cá estiou entre Água de Madeiros e o Tremelgo, sobre o que se passou na paróquia durante a minha ausência, obtive a seguinte resposta: “para além dos cocós que fluem naturalmente movidos pela gravidade e pelos espasmos flatulentos dos intestinos e dos movimentos sociais de esquerda e de direita, animais minerais e vegetais bamboleiam-se ao sabor do vento e da brisa marinha, despreocupados, nada mais se passa – non passa niente – como se o tempo voltasse atrás e tudo fosse reversível”. Fiquei reconfortado e peguei uma vez mais no livro de Cervantes para… relaxar.
2 comentários:
É verdade que, por cá 'não passa nada' ou quase nada!
Grande é a pasmaceira, de facto!
Tão grande que torna as pessoas desatentas aos pormenores, o que penso ser o caso do (seu) compadre Zé Cipriano...
Por isso, caro Relaxoterapeuta, aconselho-o a que leia, com muita atenção, o que neste Largo se tem calhandrado.
Talvez tenha algumas surpresas...
Já agora as boas vindas e os parabéns deste seu admirador pelo magnífico relato que fez desse seu mês de águas, ripanço e boa mesa (além do mais que, por pudor e ponderação, não relatou, mas que todos adivinhamos...).
Bem-vindo seja e que traga forças e bom humor para nos brindar com os seus magníficos textos durante a invernia que se avizinha...
Ó Relaxoterapeuta, pega lá um presunto:
Presunto
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Presunto tradicional de Chaves - Portugal
Presunto ibéricoO presunto é um produto alimentar obtido a partir da perna de porco ou suíno. Muito apreciado como entrada de refeição, é frequentemente utilizado como petisco, recheio de sanduíches e pizzas e outros produtos, como o folar.
É famoso o presunto de Chaves e terras do Barroso. As condições naturais de criação conferem ao presunto características próprias e diferenciadas, sendo o abate do porco compreendido entre os dezesseis e os dezoito meses e a sua exploração feita em regime extensivo, com alimentação constituída pelos produtos naturais da região transmontana.
Outro presunto, criado no Alentejo, é o ibérico (e em Olivença, terra de porco preto ou ibérico, é chamado jimão).
[editar] Indicação Geográfica
Para que a carne (Presunto)seja produzida de acordo com as regras em vigor, destaca-se designadamente, a identificação dos animais, o saneamento e a assistência veterinária, todo o sistema de produção, a sua alimentação e as condições no abate, a forma de cura e o tratamento necessário para obtenção do presunto.
A área geográfica de produção abrange os concelhos de Chaves, Boticas, Montalegre do Distrito de Vila Real e do Alentejo.
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