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quinta-feira, 25 de fevereiro de 2010

Madeira: uma tragédia anunciada


Irremediavelmente tenho que invocar o tempo.

O tempo do braço de ferro entre Sócrates e Jardim, o tempo do défice democrático na Madeira e da “guerra fria” causada pela Lei das Finanças Regionais. Este é o tempo pretérito. Depois do desastre climático que causou mortes na Pérola do Atlântico, o futuro é pintado de esperança, pelo menos é essa a convicção do Presidente da República. Esperança numa reconstrução rápida e num bom relacionamento institucional entre Sócrates e Jardim para fazer face à tragédia.

Este é ainda o tempo de um certo mimetismo mediático. Uma espécie de febre apoderou-se dos media impelindo-os a “invadir” a ilha, na mais absoluta urgência em fazer a cobertura da tragédia. Para jornais, rádios e televisões este tem sido o grande tema da actualidade e, por isso, têm dado ampla e crescente cobertura à tragédia num processo de auto-estimulação que os tem arrastado, como numa enxurrada, para a superinformação, numa espiral vertiginosa, inebriante, até à náusea. Por outras palavras, dedicam muito tempo e muitos meios à cobertura do acontecimento e estão sempre a repetir o mesmo.

Este fenómeno mediático é a centelha que tem despertado na sociedade civil inúmeras actos de solidariedade para com as vítimas da intempérie. Os políticos têm afinado pelo mesmo diapasão: Francisco Assis, líder da bancada parlamentar do PS, retira da agenda política a questão das Finanças Regionais, quebrando assim o gelo, e Alberto João Jardim garante que o Governo Regional e o Governo da República vão estar juntos na reconstrução da Madeira.

Na semana preparada pelo primeiro-ministro para o contra-ataque político em relação às suspeições levantadas pelos media contra si, esta tragédia veio, de certa forma, facilitar a vida a José Sócrates, na medida em que provocou um fenómeno de alteração do foco mediático que o colocava na ribalta pelos piores motivos.

Apesar de Jardim avisar que “só gente canalha é que tenta fazer política sobre esta tragédia” é inevitável que haja dividendos políticos para distribuir e, no lavar dos cestos, o resultado, sendo satisfatório, ou mesmo bom, para a população da Madeira que sentiu como nunca a solidariedade nacional, pode não ser assim tão vantajoso para o Governo de Alberto João. É que esta tragédia já estava anunciada há muito, como se pode perceber por este vídeo de 2008:


Será que alguém vai aprender alguma coisa com isto?

2 comentários:

Anónimo disse...

Caríssimos Calhandreiros,

é sempre complicado mandar bitaites sobre temas ainda quentes, principalmente quando ocorreram perdas de vidas humanas. É nestas alturas, porém, que toda a sociedade se mostra mais sensível para estas temáticas e, então, há que aproveitar.

Em termos de riscos naturais, o nosso concelho até se pode considerar beneficiado. Vejamos:

Em termos sísmicos, temos uma falha entre Água de Madeiros e a Marinha Grande mas, tanto quanto sei, nunca foi epicentro de algum evento minimamente significativo. Em termos vulcânicos, estamos em paz há milhões de anos e assim continuaremos.

Fruto da nossa característica orografia, podemos estar descansados relativamente a movimentos de massa (avalanches, enxurradas de lama, etc).

Relativamente às cheias, o caso muda de figura (embora continue a não ser muito grave). As ribeiras que atravessam o concelho, há muito que foram regularizadas e canalizadas. Este tipo de intervenção apresenta vantagens e desvantagens. Em situações "normais", este tipo de canalização pode aumentar o fluxo dos canais e reduzir a probabilidade de cheia. O caudal destas pequenas ribeiras, no entanto, está sujeito às mesmas regras que qualquer curso de água. Existem períodos de retorno de cheias que vão dos 5 aos 500 anos. Na prática, isto significa que num destes Invernos, o caudal de uma das nossas ribeiras irá aumentar de uma forma que nem os nossos avós alguma vez viram. Obviamente as canalizações efectuadas não estão preparadas para isso. Haverá alguns danos, mas não me parece que sejam muito graves, com uma excepção: a passagem da ribeira do Parque dos Mártires para o Parque da Cerca, atravessa algumas vias de grande tráfego, par a par com a rotunda mais movimentada da cidade - aliás, no edifício da antiga papelaria Pedroso & Gonçalves (recente sede de campanha da CDU), são já bem notórios o efeitos da erosão da água que passa lá por baixo. É um ponto que me parece necessitar de intervenção com alguma urgência.
Relativamente ao Liz, a situação é semelhante à das ribeiras: falando apenas em relação à Marinha Grande, os riscos maiores ocorrem em zonas agrícolas e não são propriamente graves.

Finalmente, restam os riscos associados ao mar. O nosso calcanhar de Aquiles. Há dois tipos de situações com um potencial destrutivo considerável: os tsunamis e as "storm surges".
Em relação aos primeiros, embora sejam situações esporádicas, a sua frequência não é, de todo, desprezível.
"Storm surges" é o palavrão utilizado para designar a elevação do nível do mar durante grandes tempestades. Se por coincidência (e coincidências acontecem), este tipo de fenómeno ocorrer durante um período de marés vivas, então o seu potencial destrutivo aumenta exponencialmente. E, por falar em coincidências, iremos ter exactamente uma associação desse tipo (storm surge + marés vivas) durante o próximo sábado.

Qualquer um destes fenómenos pode revelar-se catastrófico para o nosso litoral. A meu ver (e tratando-se de uma opinião anónima, vale o que vale), deveria ser interditada qualquer tipo de construção nos primeiros 25m a contar do mar e, progressivamente incentivado o abandono das construções já existentes. Em seu lugar deveriam ser projectados parques públicos, jardins, campos de jogos, etc. Quando o dia D chegar (e ele chegará!), seria bem mais fácil lidar com a situação...


C.

Xico da Toca disse...

Mais um bitaite oportuno de um dos sábios deste blog. Pergunto-me, qual será o tema em que não apresentará as suas doutas opiniões.