“Estes meus ‘amigos’ conseguiram o que nem a PIDE conseguiu: afastar-me da política”
Um mês depois de suspender o mandato na Câmara da Marinha Grande, João Barros Duarte, fala, pela primeira vez, numa entrevista ao Diário de Leiria, sobre a forma como foi afastado do cargo. Barros Duarte diz que deposita toda a confiança no seu sucessor, Alberto Cascalho, mas acusa alguns militantes do PCP de “compadrices, caprichos e incompetências”, e de terem desencadeado uma campanha para “corromperem” o seu nome a nível social e político
Diário de Leiria (DL) - Que marca deixou na autarquia?
João Barros Duarte (JBD) - De cultura e de preocupação de atendimento atencioso e de prestação de esclarecimentos responsáveis aos munícipes. E de empenhamento no trabalho e respeito mútuo entre chefes e subordinados. E ainda de escrupuloso cuidado na gestão financeira, respeitando os compromissos assumidos com fornecedores e prestadores de serviços à Câmara e observando os limites e determinações previstas na legislação.
DL - Sem si, a Câmara é governável?
JBD - Claro que sim. Se eu a governei, qualquer cidadão fará o mesmo e até melhor. Os homens não são insubstituíveis em nada, por muito que porventura valham.
DL - Deposita total confiança em quem o substituiu?
JBD - Deposito efectivamente total confiança no camarada que me substituiu, aliás, a primeira vez que me abordaram a proporem-me para encabeçar a lista, 'contra-propus', logo nessa altura, que fosse ele o cabeça de lista, que eu subscrevia e apoiava a escolha.
DL - Quando começaram as divergências com o PCP?
JBD - Não considero que, após 45 anos de filiação e actuação partidária, este incidente de percurso, não tanto com o partido, mas com dois ou três indivíduos, também filiados no meu partido, possa ser considerado como uma divergência com o partido.
Trata-se, tão-só, de um caso de relacionamento entre indivíduos, filiados no partido, em que três ou quatro deles aproveitaram as funções que episodicamente desempenham a nível local para, por vindicta e por não me conseguirem impor, no exercício do cargo para que fui eleito, as suas compadrices, caprichos, incompetências e vontades, desencadearem uma campanha para corromperem o meu nome a nível social e político.
Fizeram-no com o fim de proporem e justificarem, no partido a nível central, a minha substituição na presidência da Câmara, antes do termo do mandato, como previsto na legislação. E, com tanta maldade e nesse âmbito com perfeição o fizeram, que conseguiram transformar um simples caso perverso de relacionamento pessoal entre militantes do partido, num caso com a importância mediática que as pessoas acabaram por lhe atribuir.
Mas, sublinho, não existe qualquer divergência de orientação política entre mim e o partido e muito menos ideológica, como alguns por aproveitamento querem fazer crer. Só a má formação moral e a inveja, conjugadas com a incompetência e mediocridade política que têm evidenciado os indivíduos que urdiram e puseram em marcha esta cabala contra mim, reuniram as condições para esta insolência. E a arrogância e audácia que os moveu pôs em causa uma sã militância de 45 anos, que sempre foi e, confio, continuará a ser exemplar. E, com os factos políticos que inventaram neste processo que promoveram do meu saneamento, confundiram as pessoas, deram do partido uma imagem de pessegada, abalaram nas pessoas o seu conceito de respeito pelo acto de votar, deram mostras de não respeitarem os fundamentos da democracia e afastam simpatizantes e eleitores.
Ao atingirem-me do modo que o fizeram, com intuito de eliminarem o incómodo que lhes constituía a minha participação na discussão das suas propostas medíocres e injustas para as populações, mais das vezes impossíveis de se porem em prática, ou, caricatas em termos de gestão autárquica, deram com esse seu pérfido objectivo um sério golpe na credibilidade da capacidade e da actuação política do partido, aos olhos de todos os marinhenses.
Foi uma campanha contra o militante que sou, mas que visava, como veio a confirmar-se pela conclusão dos factos, retirar-me condições para o exercício da função de presidente da Câmara, para que fui eleito pelos votos do eleitorado marinhense.
Nestas condições, teve efeitos demolidores na aceitação da nossa política local e, se calhar, até nacional, pela repercussão que lhe quiseram dar, julgando que assim melhor conseguiam os seus propósitos. Foi, insisto, para além de uma imoralidade, uma evidência de como não se deve fazer política. O modo como me marginalizaram de todo este processo, mais parece um acto agarotado, do que o resultado de uma acção política pensada e discutida entre homens que têm responsabilidades concelhias no partido.
Valha a verdade, que não foi naturalmente por acaso que só dias depois de me ter sido participada esta determinação, ela foi dada a conhecer à Comissão Concelhia do partido e pedida ratificação. E as conclusões nefastas que trouxe para a causa que o partido persegue, têm responsáveis que devem assumir as consequências deste seu acto incompetente, não deixando a outros a obrigação de repararem o mal que fizeram.
Além de outros, estes factos já são demonstrativos de que o problema que se desenvolveu à volta da minha vivência partidária nada tem a ver com divergências com o partido.
Tenho-me mantido silenciado acerca desta questão, convencido de que os seus autores, assumiriam mais ponderação, o que não aconteceu.
É o que se deduz da recente insinuação, que indevidamente me atribui crime que não cometi, com a citação despropositada e desnecessária do meu nome, num recente comunicado resposta ao PS, que redigiram e fizeram publicar num jornal local.
DL - É verdade que existiu um acordo pré-eleitoral para abandonar o Executivo a meio do mandato?
JBD - Não existiu qualquer acordo, a definir qualquer tempo para abandonar o Executivo para que fui eleito. O próprio camarada que me substituiu também foi surpreendido tal como eu pelo facto, o que não fazia sentido se isso tivesse acontecido.
Há declarações à Comunicação Social, prestadas já depois da tomada de posse deste Executivo, pelo camarada responsável localmente pelo partido, a reafirmar que o meu mandato é para levar até ao fim.
Se tal tivesse acontecido, também não fazia sentido que não tivesse ficado desde início acautelada a sequência na integração dos candidatos na lista a prevê-lo, para que agora o quarto da lista para assumir a vice-presidência, não tivesse de passar por cima do terceiro da lista.
DL - Sente-se usado pelo seu partido?
JBD - A pergunta está colocada em termos nada simpáticos. Mas, na verdade, a tramóia que me montaram os responsáveis pelo meu abate ao efectivo político, permite essas leituras de envenenamento das relações que estão em causa. E, por muito que eu não queira que isso aconteça, e não quero, não vejo maneira de induzir as pessoas a não concluírem o que os factos suscitam como resposta, face à simples colocação da pergunta, em conjugação com os factos que os meus detractores puseram a correr sobre a minha posição partidária e da conclusão que o processo teve.
DL - Perante tudo o que se passou nos últimos dois meses, quem é que ficou mal na fotografia?
JBD - Na fotografia todos ficaram mal. Os sorrisos que alguns queiram encontrar nos rostos de uns ou de outros, são amarelos e vão ter sabor amargo.
Mas, a este respeito, os verdadeiros juízes ainda não se pronunciaram, só quando isso acontecer ficaremos a saber se alguém ficou bem, o que sinceramente me parece não ter acontecido.
DL- O que pensa fazer no futuro em termos políticos?
JBD - Em termos políticos não tenho projectos e sinceramente depois de um balde de água fria com que acabei de ser brindado, ou melhor, lavado da política, são fortes as razões para a colocar bem longe dos meus horizontes. Estes meus "amigos", com esta partida que me fizeram, conseguiram uma coisa que nem a PIDE conseguiu: desinteressarem-me e afastarem-me da política.
Já começo a ter pena é de que isto não tenha acontecido há pelo menos 30 anos, que não tinha tido tanto trabalho e chatices e aturado tantos carreiristas, oportunistas, garotos, incompetentes e até pequenos corruptos que fui encontrando ao longo dos tempos, infiltrados entre os políticos.
DL - Admite abandonar o PCP?
JBD - Não. Considero que isso seria uma traição aos meus ideais e convicções e esses, apesar de tudo, ainda não os perdi, nem conto abandoná-los.
DL - Que tipo de relacionamento mantém com a Câmara?
JBD - Com a Câmara mantenho um relacionamento normal como qualquer cidadão e de abertura e disponibilidade para prestar qualquer colaboração que os autarcas que a gerem entendam solicitar-me.
DL - Vai fiscalizar?
JBD - Não vou fiscalizar como é óbvio. Não tenho nenhum mandato para o efeito, nem razão ou vontade para o fazer. À Assembleia Municipal é que compete esse papel.
DL - Em que circunstâncias admite regressar?
JBD - Foi coisa que nem sequer se me colocou. Mas o que deixo registado acerca do acontecido, define e responde no seu todo, de quais as condições que hão-de estar criadas para que isso pudesse acontecer.
DL - Vê-se como uma espécie de fantasma a pairar sobre o actual Executivo
JBD - Não. É papel com o qual nem sequer simpatizo.
DL - Admite candidatar-se nas próximas eleições?
JBD - Da política tenho uma noção de sanidade, por isso, como é óbvio, por aquilo que se pode deduzir do que já expliquei nesta entrevista não existem nem perspectiva nem condições de candidatura.
DL - Por que razão não renunciou ao mandato, no dia seguinte ao anúncio, por parte do PCP, em conferência de imprensa realizada em Outubro?
JBD - A questão de maior que se me pôs, foi a de avaliar e saber da resposta a dar à posição dos eleitores que não sendo do partido votaram em nós e, tal como eu, não foram ouvidos neste processo.
“Fiquei triste e amachucado”
DL - A primeira baixa médica foi uma forma de pressionar o PCP a recuar na decisão de o substituir, ou ainda pensou assumir a presidência?
JBD - Não. Nem uma coisa nem outra. Não fazem parte dos meus procedimentos chantagens de qualquer ordem para atingir fins de cariz pessoal, e muito menos em casos que envolvam ou possam envolver aspectos polémicos. A baixa médica foi o resultado do estado de esgotamento que me atingiu por sobrecarga de trabalho, que veio a agudizar-se com o inesperado surgimento do caso em questão, numa data em que me preparava para ir de gozo de férias, com que esperava recompor-me.
Tinha acabado de viver um período de excesso de trabalho, para resolver a acumulação de serviço devido ao facto de, às tarefas normais dos meus pelouros, se terem junto as dos pelouros dos demais colegas da vereação, em gozo das suas férias, o que me colocou no limite, que ficou ultrapassado com os problemas imprevistos que a nova situação criada me colocou.
Senti-me até pesaroso de ter tido necessidade de apresentar atestado médico, porque, em 63 anos de trabalho que já levo, foi a primeira vez que o fiz. Atestado médico subscrito pelo Senhor Doutor Mário Roldão que continua a ser um dos melhores profissionais do nosso concelho, pese reconhecer que felizmente temos na nossa terra muito bons médicos.
De resto, que fique bem esclarecido que não fiz pressão nenhuma nem com atestado médico nem de qualquer outra forma. É oportuno até esclarecer de que, após o dia 11 de Outubro de 2007, em que me foi comunicada no partido local a posição que assumiram, não voltei mais ao serviço oficialmente, senão no fim do período em que estavam previstas as férias e, apenas por um dia, para assinar assuntos pendentes, entrando seguidamente de licença por doença, seguida de pedido de suspensão do mandato. E, sobre o assunto, nada fiz, junto de quem quer que fosse, no sentido de que fosse alterada aquela posição.
A única coisa que verdadeiramente me afligiu e preocupou, isso sim, foi o assumido e ostensivo desprezo a que me votaram em todo este processo, que culminou com a comunicação que me fizeram como facto decidido e consumado em fase e em condições em que já não havia retorno.
Além da encenação estabelecida ser anunciadora de que ia acontecer algo de pouco amigável e, por isto e tudo o mais, afrontosa e de indignidade revoltante.
Foi nesse cenário pouco amistoso, que então, de entre os três circunstantes que o compunham, um deles, jovem de brinquinho na orelha e com o sotaque madeirense, donde creio seja natural, então me ditou: "de que o Partido tem vindo a fazer a análise à actuação da Câmara e concluiu que o trabalho desenvolvido está a degradar a tua imagem e a da Câmara CDU que temos de salvaguardar, pelo que propomos que peças a rescisão do mandato”.
Fiquei triste e amachucado, sem reacção, como é natural num profissional brioso que sempre procurei ser e consegui e, porque, militando à longa data, com provas dadas e cumpridor da orientação do partido, nunca tinha sido colocado perante tão chocante situação.
Primeiro, porque a existir tal análise ela tinha sido mal feita e a conclusão era mais do que errada, e injusta. Só a oposição podia ter feito tal trabalho. Segundo, porque era estranho e, mais do que isso, mesmo anormal que o meu partido tivesse em seu poder um trabalho deste teor e não mo tivesse facultado e mesmo discutido comigo, para adoptarmos as medidas correctoras que o estudo nos aconselhasse.
Terceiro, mesmo que fosse verdade haver análise, punha-se a questão de descobrir se a degradação das imagens apresentada como justificação para a imposição que me estava a ser colocada era devida apenas e só à actuação do Presidente de um Executivo integrado por outros membros, alguns dos quais também da CDU, a quem também não tinha sido comunicada a conclusão da análise, visto que nenhum deles me havia chamado à atenção, como suponho que aconteceria ser lho tivessem participado.
Tudo isto é tanto mais estranho e difícil de compreender, quanto tal contrasta com a insistência que fizeram para que aceitasse candidatar-me, há apenas dois anos. Além de que, quando o partido concedia a um militante a confiança de o candidatar a presidente de Câmara, era porque lhe merecia confiança e, nestas condições, uma decisão destas exigia, no mínimo, que o visado participasse na discussão e decisão da medida e nunca fosse, como no caso, colhido de surpresa e como facto decidido.
Não dá para entender, porque não foi explicado, que dispensem a experiência do militante que aliciaram e pressionaram a candidatar-se, sob a alegação para o efeito de que essa era em seu entender uma valia útil para o desempenho das tarefas do cargo, e constituía forma de a transmitir aos novos autarcas. Ora, que eu saiba, nem a oposição pôs isso em causa até agora.
Nessa altura, quando fui convidado para me candidatarem, só face às insistências, que me pareceram apoiadas em justificações sérias, aceitei. Enganei-me, como agora os factos demonstram.
Tudo eram rosas, ele eram elogios ao meu trabalho nas funções que anteriormente tinha desempenhado, ele era não verem problema na minha idade que eu invocava como óbice para recusar o convite, quando agora foi uma das justificações que avançaram para justificarem o saneamento. Enfim, louvaram-me até me convencerem.
Acabei por trocar um 'part-time' que tinha no Banco da Habitação do Grupo BCP, de que gostava e se resumia à execução de tarefas da confiança da Administração, trabalho apenas exigente em conhecimentos e experiência na matéria, mas prestigiado e calmo, por este inferno que é gerir e conciliar os mais simples aos mais estapafúrdios interesses que se movem à volta da Câmara, o que torna a vida do presidente trabalhosa, stressante, instável e cheia de problemas, que por experiência própria já conhecia.
Fiz jus deste modo ao adágio muito popular que reza que o homem é o único animal que tropeça duas vezes na mesma pedra.
(surripiada do Diário de Leiria)
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quarta-feira, 12 de dezembro de 2007
Revista de Imprensa (o homem está imparável)
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13 comentários:
Finalmente!
Que um militante do partido comunista já pode, fora dos orgãos próprios desse mesmo partido emitir opiniões sobre o que se passa no seu interior.Os ventos da liberdade finalmente estão a passar por aqui.Os meus parabens aos responsáveis politicos do PCP.
Ainda tenho presente a miseravel expulsão dum velho militante comunista, com uma vida inteira dedicada ao partido, precisamente porque escreveu um artigo num jornal local,com o titulo " Porque não voto em João Barros Duarte".
Finalmente, pelo menos na Marinha Grande há liberdade de expressão.
O entrevistado não terá pedido autorização - era o que faltava - para dar uma entrevista.
Apesar de não citar nomes, as palavras são claramente direccionadas.
Por outro lado, é possível verificar o tipo de gente que faz e se movimenta na política.
É por estas e por outras que Portugal é como é, triste, degradado, retrógada e amordaçado...
E por aqui se vê como o PC funciona.
Este JBD realmente não os tem no sitio então quem o pôs a andar retirando a confiança politica foi o PCP (o famoso colectivo) mas a culpa é só de três ou quatro militantes, fraquinho muito fraquinho.
"porqué não te calas?"
João Barbas I continua a tentar justificar a mais que justificada saida de cena.
A verdade é que não estavas a fazer nada de jeito!!
Foi pena não teres levado o AAutocolante contigo!!!
Boa....ahahahaha
Não sou particularmente fã da pessoa. No que toca às intervenções na causa pública, acho que já teve o seu tempo e o seu mérito. Mas gostava era de ver os que acusam o JBD de falta de "tomates" a, nas mesmas circunstâncias, tomarem atitudes semelhantes de cara descoberta! Ai isso é que gostava. Provavelmente até lhe davam palmadinhas nas costas e, solidários, carpiam com ele as traições.
Não acho que a dignidade dos homens se possa classificar pelo uso de brincos na orelha ou por patilhas à forcado. Lamento é a mediocridade, a cada vez maior ausência de valores, a superficialidade, a ligeireza com que se atiram pessoas dignas para a lama e o "salve-se quem puder" que, 33 anos após Abril, cada vez mais, está instalado.
É só fumaça. É só fumaça (e ainda por cima de muito má qualidade...)!
Quem assim actua não pode deixar de ser conoctado com aqueles que pretendem, com toda a fumarada possível, desviar as atenções das coisas (ir)releventes que por cá se passam.
Mas como estão enganados!...
A si, anónimo das 9:53, quem o apagou foram as declarações do JBD.
Deixem-se mas é de cortinas de fumo e encarem os vossos problemas de frente
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